O ex-assessor da Presidência da República para Assuntos Internacionais, Filipe Martins, afirmou nesta quinta-feira (24) que foi usado como “bode expiatório” pelo tenente-coronel Mauro Cid, delator de uma suposta trama golpista que teria como objetivo manter o ex-presidente Jair Bolsonaro no poder após a derrota eleitoral de 2022.
Martins prestou depoimento por mais de quatro horas como um dos seis réus do chamado “núcleo 2” da denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Segundo a PGR, esse grupo seria composto por assessores de alto escalão do governo Bolsonaro que teriam atuado na organização e no gerenciamento de ações como a elaboração de uma minuta de decreto de estado de defesa e o uso da Polícia Rodoviária Federal (PRF) com fins políticos.
A denúncia aponta que Martins teria participado de uma reunião com Bolsonaro e os comandantes das Forças Armadas em 7 de dezembro de 2022, ocasião em que teria apresentado uma minuta de decreto que visava impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. Em seu depoimento, Filipe Martins negou presença na reunião e alegou que sua citação na delação de Cid não tem provas. “Somente com base na palavra dele que se criou essa ideia de que eu teria redigido uma minuta de decreto golpista”, declarou.
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O ex-assessor também afirmou que a delação de Cid já foi questionada por órgãos como a Polícia Federal (PF) e a própria PGR. “Chegando a dizer inclusive que havia indícios de que ele poderia estar protegendo pessoas”, acrescentou. “E eu tenho a convicção de que ele poderia também estar procurando bodes expiatórios, me colocando numa reunião em que eu nunca estive”.
Questionado pela procuradora Gabriela Starling sobre registros que indicariam sua entrada no Palácio da Alvorada na mesma data da reunião, Martins apresentou documentos obtidos junto à Corregedoria-Geral da União (CGU) e contestou a validade do registro, apontando supostos erros de grafia e ausência de confirmação por parte de testemunhas.
Ele também destacou o depoimento do general Freire Gomes, então comandante do Exército, que teria dito à Polícia Federal que “possivelmente” Martins estava presente na reunião. “’Possivelmente’ indica dúvida, incerteza. No entanto, a PGR, ao concretizar o texto da denúncia, suprime a palavra ‘possivelmente’”, declarou Martins.
Durante o interrogatório, Martins relatou que está impedido há quase dois anos de se manifestar publicamente sobre o caso. “Estou sob censura há quase dois anos, não posso conceder entrevistas, não posso me manifestar por redes sociais, não posso ser filmado, não posso ser fotografado”, disse. “Ainda não tive a oportunidade de fazer isso que eu estou fazendo hoje. Há muita coisa a ser dita.”
Filipe Martins também afirmou que sua prisão preventiva, ocorrida entre fevereiro e agosto de 2024, teria sido solicitada pela PF com base em informações sobre uma suposta intenção de fuga. As autoridades teriam encontrado uma lista de passageiros para o voo de 30 de dezembro de 2022, em que Bolsonaro viajou para os Estados Unidos, e onde Martins teria sido incluído. No entanto, segundo o ex-assessor, sua presença nunca foi confirmada na lista final.
O embaixador André Chermont, então chefe do cerimonial da Presidência, também declarou que Martins não constava entre os passageiros previstos para o voo.
A defesa de Martins sustenta que a prisão foi injustificada e que houve atuação seletiva da PF, ignorando provas de que o ex-assessor não deixou o Brasil no período.
Todos os réus do núcleo 2 respondem pelos crimes de organização criminosa armada, golpe de Estado, tentativa de abolir o Estado Democrático de Direito, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. As penas podem ultrapassar 30 anos de reclusão.
Os depoimentos estão sendo realizados por videoconferência, com transmissão ao vivo pelos canais oficiais do Supremo Tribunal Federal (STF). A audiência é conduzida pelo juiz auxiliar Rafael Henrique Janela Tamai Rocha, que atua no gabinete do ministro Alexandre de Moraes, relator do caso.




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